Mendoza, cidade argentina a oeste do país, tinha tudo para dar errado. Encravada em plena aridez agressiva da cordilheira dos Andes, a capital da província de mesmo nome possui um dos mais baixos índices de chuva da Argentina, foi destruída por terremotos avassaladores e está localizada em uma região de geografia pouco convidativa (não pela falta de impressionantes opções paisagísticas, mas por sua dura e particular formação).
No entanto, os insistentes habitantes locais não se entregaram assim, facilmente, e foram responsáveis (com uma boa e generosa ajuda da natureza) por transformar aquele deserto em um cobiçado oásis turístico que, desde tempos coloniais, já servia como uma importante via de acesso entre o oceano Pacífico e as altas montanhas andinas.
A falta de água foi substituída por canais de irrigação que recortam as ruas do alucinado centro, conhecidos como acequías; túneis naturais feitos com árvores amenizam o calor sufocante da região; e belas praças, estrategicamente, espalhadas pela cidade, já não lembram os abalos sísmicos como o de 1861, que chegou a riscar do mapa o setor colonial.
Mendoza é, sem dúvida, uma das melhores sensações que o visitante brasileiro pode ter em terras vizinhas, sobretudo as visuais. Nos meses mais quentes, em que os termômetros batem os 40°, a seca região se pinta com variedades cromáticas em que predominam os tons ocres das montanhas andinas e amarelados dos álamos a beira das estradas. Nem o violento rio Mendoza fica de fora e suas águas mais claras se escurecem, alteradas pelo período de chuvas (que nem merece tanta atenção assim, já que os índices pluviométricos não ultrapassam os 200 milímetros anuais).
No inverno, a região troca seu figurino e se veste de branco. Neve, estações de esqui e baixas temperaturas dão outro tom à viagem. A paisagem paralisa e o visitante se sente pequeno diante daquelas imensas formações rochosas. Nessa época do ano, algumas atrações naturais se recolhem até a temporada seguinte, como o Aconcágua, o ‘teto das Américas’. Mas mesmo assim vale a pena encarar o frio congelante da Ruta Nacional 7, principal conexão comercial entre a Argentina e o Chile, para tentar imaginar o que guardam os 6.962 metros da montanha mais alta do continente.
Mas o clima seco e a qualidade daquele solo árido, aliados a técnicas inovadoras de plantação, garantiu à Mendoza outra boa sensação: suas vinícolas. Malbec, cabernet sauvignon, tempranillo e chardonnay. São tantas castas de uvas disponíveis que nem Baco, o deus romano dos vinhos e das festas, deixaria de se entregar aos aromas da região (ainda que a vida noturna de Mendoza esteja bem longe do agito das noites de Buenos Aires).
Mendoza é considerada um dos principais vinicultores da América do Sul, o que justifica a existência de mais de 1.200 adegas em toda a província. No entanto, os passeios guiados por belos cenários andinos costumam oferecer muito mais do que uma simples (e saborosa) degustação da variedade de vinhos produzidos na região.
Museus, almoços ao ar livre, visitas guiadas para conhecer as etapas de produção e até butiques para as compras (de vinho, claro) são algumas das deliciosas opções oferecidas pelas empresas.
Sem dúvida, esse é um dos melhores investimentos que o viajante pode fazer na cidade para brindar o espetáculo paisagístico encontrado em Mendoza. São tantas as sensações que o viajante é capaz de pensar que tudo aquilo é resultado do efeito embriagante da bebida. Mas não é. É Mendoza no seu mais puro e lúcido estado.
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