Ostentação em redes sociais pode virar prova contra devedores trabalhistas

Uma recente decisão da Justiça do Trabalho acendeu um sinal vermelho para o empresariado brasileiro: ostentar luxo nas redes sociais enquanto sua empresa acumula dívidas pode custar não só a reputação — mas também o passaporte e a CNH.

No caso julgado pela 2ª Vara do Trabalho de Barueri/SP, a Justiça determinou a apreensão desses documentos da representante de uma empresa em execução trabalhista. A justificativa foi clara: há uma gritante contradição entre o discurso de crise financeira apresentado nos autos e a ostentação pública de viagens internacionais, festas e bens de alto valor postados nas redes sociais.

Essa medida não saiu do nada. Está respaldada no artigo 139, inciso IV, do Código de Processo Civil, que autoriza o juiz a aplicar medidas atípicas para garantir o cumprimento de ordens judiciais — inclusive aquelas que restringem direitos civis, desde que fundamentadas e proporcionais.

Em outras palavras: quem ostenta luxo em público enquanto afirma insolvência em juízo corre o risco de sofrer sanções severas.

Sua imagem digital pode ser usada contra você

O que antes era apenas uma questão de reputação agora se tornou prova. Redes sociais, blogs e perfis públicos passaram a ser considerados fontes legítimas de indícios de capacidade financeira. Essa prática já vem sendo reconhecida por tribunais trabalhistas em todo o país.

E não pense que apenas o sócio formal está no radar: o Judiciário também mira o “sócio de bastidor”, aquele que, mesmo fora do contrato social, aparece com frequência em registros públicos de ostentação. O princípio é simples: se há sinais exteriores de riqueza, há margem para execução.

Imagine a situação: a empresa FLOR LTDA. deve mais de R$ 400 mil em verbas trabalhistas e alega crise financeira no processo. Contudo, a sócia Fulana aparece no Instagram em um jantar em Paris, marcando localização na Champs-Élysées, vestindo grifes e lotada de sacolas de compras.

A postagem, tornada pública, foi anexada aos autos pelo advogado do ex-funcionário. Resultado? A juíza do trabalho entendeu que havia contradição entre a suposta incapacidade de pagamento e o padrão de vida exibido, determinando a apreensão de documentos pessoais da sócia como medida coercitiva. O processo ganhou fôlego, e a empresa acabou firmando acordo sob pressão.

Danos além do processo: imagem e negócios em risco

Para além das consequências processuais, há o prejuízo à imagem empresarial. Em um ambiente de negócios cada vez mais pautado por governança, integridade e ESG, incoerências públicas afetam relações comerciais, acesso a crédito, e podem comprometer parcerias estratégicas. Nenhum investidor ou fornecedor quer se associar a uma empresa que parece ignorar obrigações trabalhistas básicas enquanto ostenta prosperidade online.

Ostentar pode custar caro — inclusive sua liberdade

Se sua empresa está em fase de execução, o recado é direto: mantenha discrição, cumpra suas obrigações e trate a Justiça com seriedade. Postar luxo em tempos de inadimplência pode não apenas fragilizar sua defesa — mas fortalecer o argumento do credor e resultar em medidas duras.

Essa nova postura do Judiciário não é simbólica. Ela é prática, direta e cada vez mais comum. Ignorar esse cenário é um risco que nenhum gestor consciente pode se dar ao luxo de correr.

BEATRIZ CHAMI DE ALMEIDA LIMA, advogada trabalhista do escritório Pamplona, Braz & Brusamolin Advogados Associados

beatriz@pamplonabrazbrusamolin.com.br

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