Sonegação em países ricos é 25 vezes maior que corrupção nos países pobres

Uma visão muito difundida sobre o desenvolvimento econômico afirma que os problemas enfrentados pelas economias em desenvolvimento e os países pobres se devem à corrupção. Essa visão se choca com um dado contundente da realidade internacional: a China. Nem mesmo o Partido Comunista põe em dúvida que a corrupção é um dos grandes problemas nacionais, o que não impediu um crescimento médio de dois dígitos nas últimas três décadas.
No entanto, segundo Jason Hickel, professor da London School of Economics, esta perspectiva oculta um problema muito mais fundamental em termos sistêmicos para a economia mundial: a corrupção dos países desenvolvidos. Trata-se de uma corrupção do colarinho branco, invisível e refinada, que foi uma das causas do estouro financeiro de 2008.
Segundo a ONU, a corrupção custa aos países em desenvolvimento entre U$ 20 e 40 bilhões anuais.
Jason Hickel: O presidente do Banco Mundial, Jim Kim, fez este cálculo sobre o custo da corrupção no mundo em desenvolvimento. Mas esta soma, sem dúvida importante, constitui apenas cerca de 3% do total de fluxos ilícios que abandonam os países em desenvolvimento a cada ano. A evasão fiscal é 25 vezes maior que essa soma. No ano passado, cerca de um trilhão de dólares fugiram dos países em desenvolvimento e terminaram em paraísos fiscais por meio de uma prática conhecida como re-faturamento, através da qual as empresas falsificam documentos para que seus lucros apareçam em paraísos fiscais nos quais não pagam impostos, ao invés de aparecer nas jurisdições onde as empresas realizaram esses lucros. As multinacionais comercializam seus produtos entre suas próprias subsidiárias para pagar na jurisdição onde o imposto é mais baixo, algo que envolve cerca de um trilhão de dólares anuais, mais ou menos a mesma coisa que o re-faturamento.
Por que a evasão é tão fácil?
Jason Hickel: Porque as regras da Organização Mundial do Comércio permitem aos exportadores declarar o que bem entendam em suas declarações alfandegárias. Isso lhes permite subavaliar seus produtos para que paguem menos impostos. Isso não deveria nos surpreender dada a ausência de democracia interna da OMC.
O poder de negociação na OMC está determinado pelo tamanho do mercado e as decisões mais importantes são tomadas em reuniões do chamado “quarto verde”, administrado pelos países mais poderosos, de maneira que o comércio mundial termina sendo manipulado em favor dos ricos.
Curiosamente, no índice mais difundido em nível global sobre corrupção, o da Transparência Internacional, se apresenta um panorama exatamente oposto…
Jason Hickel: Ele tem uma série de problemas. Em primeiro lugar, se baseia na percepção da corrupção que há no próprio país. De maneira que os pesquisados não podem dizer nada sobre o que pensam acerca de outros modos de corrupção como, por exemplo, os paraísos fiscais ou a OMC. Em segundo lugar, como o índice mede mais percepções do que realidades, está exposto às narrativas dos departamentos de relações públicas.
A narrativa dominante é promovida por um complexo de organizações, desde o Banco Mundial até a USAID e passando por muitas ONGs, que centram o tema da pobreza na corrupção dos próprios países em desenvolvimento.
Estados Unidos e Reino Unido. Qual é a situação real destes países a respeito da corrupção?
Jason Hickel: Segundo a Transparência Internacional, os Estados Unidos estão bastante livres da corrupção. Segundo a Rede Tax Justice, em troca, os Estados Unidos estão em sexto lugar no ranking da corrupção mundial, devido ao fato de que têm jurisdições secretas que permitem que funcionem como centros de evasão tributária. Além disso, sabemos que a corrupção atravessa o sistema político estadunidense. As corporações podem gastar dinheiro sem limites nas campanhas políticas para assegurar que seus candidatos sejam eleitos.

Agência Carta Maior